quarta-feira, 6 de maio de 2015

06/05/2015


    Segunda-feira sem café... Mãos presas ao volante, rádio ligado- está tocando a minha música, sempre a mesma. Aumento o volume e toda a cidade sabe que estou chegando, com mais histórias em papéis amassados pelo peso da minha Remington sobre eles. Hoje o trânsito está infernal, o que não era surpresa alguma na semana. Parado próximo a Paulista, coloco a cabeça para fora da janela do carro para xingar o motorista da frente- aquela mula. Sem perceber na hora, só depois, é que notei alguém passando na frente do meu carro. Passou assim, de repente, com passos longos em pernas bem curtas. Ela levava consigo uma bolsa e um guarda-chuva; na cabeça uma touquinha vermelha, escondendo rosto mas deixando à mostra os cabelos loiros na altura do ombro, que dançavam uma leve valsa com o vento frio. Foi questão de segundos, segundos que pareciam horas. Junto com esses segundos, lá se foi a briga com a mula da frente... lá se foi ela!
  Perdi o rumo. "Aonde é que eu estava indo mesmo?". Sem pensar duas vezes, saí da Alameda Santos e entrei na R. Pamplona- nome engraçado esse, seria o nome de alguém famoso que não está nos livros de história?-, virando à esquerda rumo ao MASP. Andei devagar, quase parando, tentando achá-la  entre os engravatados que só andam juntos, os hippies que fazem lindos colares, os artistas de rua que arrancavam sorrisos de quem parava para assistir, as pessoas que adoravam ficar olhando para aqueles enormes prédios. Rostos novos, pessoas novas. Que história interessante cada uma deveria ter? Ora, isso não importa no momento. Continuei focado na minha busca,  até finalmente encontrar. Continuava com seus passos longos e a mochila nas costas. Acelerei um pouco mais. Foi quando vi pela primeira vez aquele rosto. Tudo era perfeito: o jeito de olhar no relógio para ver se estava atrasada para sabe-se lá o que, os lábios comprimidos para emitir um leve assobio, os olhos que quase me fizeram atropelar uma senhora que passeava com o seu Pug. De repente, percebo que estou sendo observado por aqueles mesmos olhos. Retribuo o olhar, com vergonha. Ela deixa escapar um pequeno sorriso e entra em um prédio. Será que aquele sorriso foi  algum "eu volto já"? Ou um "me espere".
  Estacionei meu carro em uma vaga proibida e andei até o prédio. Fiquei sentado em um banco do ponto de ônibus que ficava bem na frente dele. Sem nervosismo, nem ansiedade, só aquela velha esperança. Meia hora havia se passado e nada. Duas mulheres já haviam me perguntado qual o ônibus que passava na Consolação. Não soube responder. Só esperar. Ela!
  Quase 17:00 e nada. Já tinha ficado amigo dos hippies e de um senhor que tocava saxofone. Porra, aquilo era incrível. Fui convidado para escrever poesias junto com um zé-ninguém, assim como eu. Não recusei, nem aceitei. Simplesmente sorri e voltei para a frente do prédio. Por um leve descuido, não percebo as pessoas saindo e para a minha surpresa ela também está. Tento atravessar a rua, mas o sinal abre para os milhares de carros passarem. Quando consigo atravessar já é tarde demais. Nem penso em pegar meu carro. Só corro, enquanto seguro um pedaço de papel amassado. São longos quarteirões. Coração quase saindo pela boca - seria meu sedentarismo ou o nervosismo?. Ela entra no metrô e em seguida venho, descendo rapidamente a escada rolante. Ela está entrando em um vagão, quando berro. A moça percebe e pede que eu seja rápido. Sem pensar duas vezes, entrego aquele papel que estava no meu bolso. Ela sorriu e entrou de volta no vagão sem ter perguntado o meu nome.
  Foi quase chegando em casa que percebo que entreguei o papel errado. Não era o meu telefone que estava com ela e sim um conto que eu havia escrito de manhã. Nunca saberei se ela gostou ou se me procurará. Ela não conseguiu o meu telefone, mas conseguiu os meus sentimentos. Isso já vale muito, eu acho. Hoje rezo para que aquela mesma moça passe novamente pela frente do meu carro, mas em vez de passar direto, que pare e diga que leu tudo o que estava escrito e que pela primeira vez pergunte meu nome.

  -Prazer, Matheus!

 - Prazer, Gabriela!

(Ontem pude vê-la, mas nos meus demorados sonhos)