domingo, 16 de novembro de 2014

Contos de fim de ano - O mascate

(Perfeito para ler em uma manhã de domingo)

Morei em Pernambuco durante toda a minha infância e adolescência.Pernambuco não era muito conhecida naquele tempo.Foi ganhando sua importância mais para a frente.
  Eu não tinha muitos amigos,só tinha Marcos - o garoto da casa vizinha.Naquele verão foi tudo diferente: Marcos estava viajando,o que fez com que eu procurasse um novo amigo.Tentei me enturmar  com os garotos da Rua 4 ,mas não consegui - eles eram bem mais velhos.Desisti por um tempo de amizades e tentei me divertir só com o que eu tinha: Uma bola de futebol e uma pipa.Sem me importar por estar sozinho,eu passava todas as tardes com aquela Bola e pipa;fingia ser o dono do mundo,imortal,só eu e o mundo inteiro.
  Na primeira semana  foi até fácil brincar sem a companhia de Marcos,mas na segunda semana aquilo foi perdendo a diversão e acabou se tornando em um enorme poço de tédio.Infelizmente eu não podia fazer nada.
 Eu já estava ficando sem ideias de como se divertir sozinho.Resolvi me sentar em frente a rua e observar quem passava.Eram crianças,jovens,adultos,idosos que passavam pela estrada de terra.Mulheres carregando seus filhos,rapazes à procura de uma vida melhor,o tempo que demorava para passar.Ao contrário de minhas brincadeiras,ver aquelas pessoas caminhando pelas ruas não era algo repetitivo.
 Onde eu morava,a chegada de mascates era novidade.Em poucos dias eles já passavam de casa em casa oferecendo seus produtos e alegrando a clientela.Cada rua era visitada por um mascate todas as tardes.Na minha passava Jacó - só fiquei sabendo seu nome porque toda vez que chegava na rua se apresentava para quem dava ouvidos - que vendia bolsas e ferramentas.Todo dia Jacó passava,sempre sorrindo,até que um dia me viu sentado e decidiu conversar comigo. "Muito prazer garoto,me chamo Jacó e vendo objetos úteis,quer comprar algo?"."Não,obrigado". Sempre sorridente,ia mais uma vez o mascate amigo de todos - também se tornou meu amigo.E foi uma amizade muito forte.Já se acostumara com meu jeito de se divertir.Sempre no finalzinho da tarde ele ia se despedir e me contar algumas histórias de seu trabalho.Eram fascinantes.Pena que fomos amigos por pouco tempo.
  Jacó leva o trabalho muito a sério e não tem tempo para pensar em amores.Algo,ou melhor,alguém mudou tudo isso.Marcela,a sua freguesa,fez com que o pobre mascate se apaixonasse por aquele sorriso simples que sempre fascina.A rotina continuava a mesma: De porta em porta Jacó ia oferecendo seus produtos.
  O relacionamento do Mascate e da freguesa acabou se tornando coisa séria.Ele decidiu procurar um emprego melhor em outra cidade,abandonando as ruas de Pernambuco.Ela o acompanhou.O casal apaixonado foi embora daquela simples rua.Marcos voltou para casa,mas eu até nem ligava muito.Ao mesmo tempo que tenho um amigo ao meu lado,perco outro que acabara de ganhar.
  E aquela simples rua não continuou a mesma depois da partida de Jacó.Ficou mais triste.Passa- se anos e a situação continua a mesma.Nunca mais vi Jacó em toda a minha vida.Onde estará aquele mascate que deixa felicidade por onde passa?Até hoje fico sentado esperando Jacó retornar e como sempre sair se apresentando para deus e mundo.Talvez ele volte um dia,enquanto isso continuo plantado do lado de fora de casa com a esperança de rever meu velho amigo.Dizem que cada um vai para um canto;nunca pensei que isso realmente fosse verdade.

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