segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Crônica de Segunda

Olhei o horóscopo - duas vezes hoje e em jornais completamente diferentes. O que diziam? A mesma coisa que leio desde os sete anos de idade, quando um parente meu- não lembro quem foi, só de sua voz- leu uma revista de bairro para mim. A pessoa então olha para um início de ser que eu era e lamenta com antecedência. Descubro então que tenho o Sol em Áries. Poxa, é um nome bonito – respondo com a inocência que talvez até hoje tenho. Mas para o parente isso não interessa, fui condenado e agora devo seguir em silêncio com esse fardo em ser ariano. 

Eu então tirei a revista de bairro das mãos desse parente e fui para um canto ler o restante. Bom, ler eu ainda não sabia muito bem – só algumas palavras como: casa, amor, boneco. Eram doze imagens diferentes, doze signos que alguém algum dia disse serem diferentes. Olho cada um olho a olho e escolho um – acho que foi gêmeos ou libra. Volto para o mesmo lugar de antes e aponto a imagem da revista para o parente. Digo que quero ser aquele, tenho que ser aquele. Por alguma razão cósmica ou infantil eu devo e necessito ser aquele. Mas escolhas são coisas que um garoto de sete anos nunca vai entender a seriedade disso – nem mesmo pessoas adultas entendem, nem mesmo eu entendo ainda. O parente quase cai da cadeira em que está e diz que isso é um A-B-S-U-R-D-O. Isso-não-é-uma-coisa-a-ser-escolhida-ou-você-é-açúcar-ou-você-é-sal-seria-muito-mais-fácil-se-as-coisas-fossem-assim-mas-vai-brincar-criança-que-um-dia-eu-te-explico-melhor-como-é-essa-coisa-de-signos-nem-mesmo-eu-entendo-mas-como-sou-adulto-eu-tenho-que-entender-caso-contrário-eu-não-estaria-te-contando-isso-agora-mas-tenha-calma-eu-sei-que-ariano-é-meio-impaciente-mas-eu-te-peço-só-um-pouco-mais-para-você-não-ficar-com-isso-na-cabeça-a-vida-inteira-signos-são-só-bobagens-nada-disso-que-falam-realmente-acontece-é-só-uma-maneira-de-descontrair-a-vida-um-pouco-vai-brincar-vai-pode-ir-e-deixa-essa-revista-que-preciso-ver-o-que-meu-signo-diz.

Engraçado, nem sei ao certo se isso realmente algum dia na minha vida de fato aconteceu – como isso aqui é uma crônica ela deve conter só fatos do cotidiano, mas agora já foi e cansa tentar apagar tanto erro nosso – só tenho a certeza de que um dia alguém me contou isso. Não poderia, na idade que eu tinha, inventar uma coisa dessas.

O problema é que hoje é Segunda-Feira. O problema talvez não seja a Segunda em si, porque Terça também não é um dia bom e nem toda Sexta é motivo de alegria, sem contar no Domingo que não é essa maravilha toda que falam. O problema deve ser eu mesmo. Peguei uma mania terrível de ler meu horóscopo em jornais diferentes e comparar cada um, assim fica mais fácil decidir qual devo me importar- peguei esse vício graças a porcaria de um conto espetacular. Esse é o problema mesmo, nada flui naturalmente, nada anda por vontade própria. Tudo está sendo exatamente, planejado-calculado-revisado-analisado-planejado-calculado-revisado-analisado-analisado-revisado-calculado-planejado-analisado. 

É demais pedir um pouco de anomalia nas coisas? Eu sei que não é, mas é muito difícil tentar ser diferente em uma Segunda, porque ela não é a primeira Segunda que enfrento e a Terça de amanhã sei que não é novidade, da mesma forma que Sábado será ensolarado e depois nublado. Falta alguma coisa que até agora não consegui perceber. Alguma coisa falta que agora até perceber não consegui. Então termino de escrever essa crônica e tomo um pouco de café, que já tem o mesmo gosto de sempre – e dá para mudar isso?. Assim que resolvido esse caso, volto a escrever.

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