segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Um acaso no caso

Talvez essa ideia de texto livre seja uma coisa boa, no final das contas. Mais uma vez esqueci meu caderno de textos, dessa vez por vontade própria. Deixei ele lá, não na cabeceira, na mesa do trabalho mesmo.

Na hora do almoço, tentei procurar por aquele mesmo homem da terça, que julgo ser único. Sem sucesso. Sua amizade com a cadeira vazia deve ter acabado ou simplesmente nunca existiu amizade.

Em algum momento de nossas vidas, faremos a seguinte pergunta: eu estou louco? Esse momento chegou para mim. É triste dizer isso, mas sinto de verdade que chegou. 
Como as pessoas podem entrar e sair da vida de alguém assim, sem ao menos deixar um guardanapo discado de bilhete? Hoje aconteceu de novo, bem no meio de uma semana.
Perdi o ônibus que pego compulsivamente no mesmo horário. Acenei para o motorista, que acenou para mim. E foi embora. Acertei no gesto, pensei. Um gesto de despedida. Tive que pegar o segundo ônibus, um ônibus diferente, com aromas e pessoas diferentes. O outro tinha cheiro de pão mofado- e isso tem cheiro?- enquanto esse cheirava a café forte. Mesmo gostando do bom e velho companheiro, estranhei seu aroma. 

Gritei para o motorista liberar a catraca. Uma desconhecida me respondeu, uma voz que pertencia ao homem que dirigia o ônibus. Indo para o fundo, fico ao lado de um homem sentado. Usava um suéter preto, com algumas bolinhas de cobertor. Era pálido, na luz era translúcido. Subi meus olhos para sua cabeça. O cabelo liso, meio jogado de lado. Aqueles olhos, olhos conhecidos. Foi então que no meio de tantas pessoas diferentes, eu conhecia alguém. 

Você parece alguém que ja vi, ou melhor, que já ouvi. O homem olhou vagarosamente para mim. Não respondeu. Voltou seus olhos para um grande nada do lado de fora da janela. 
Não era para eu vê -lo. Nem somos próximos. Não faz nem um mês ao certo que te conheço. O homem nada disse, continuou com o que estava fazendo. Pensei em uma última pergunta, mas ja já descer no próximo ponto. 

Desci e entrei na rua que sempre entro. Pensando ainda na última e decisiva pergunta, lembrei e grave falta que cometi. Assim como todos os outros, esqueci de deixar um bilhete de despedida.

Talvez amanhã eu deixe, se nos encontrarmos.

( acreditar que não foi uma despedida alivia um pouco mais a minha pesar consciência )
( assim espero )
( e quem sou eu para encontrar David Bowie no ônibus?)

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